
Voz
World Connection, 2005
Apenas acompanhada à guitarra, a cantora cabo-verdiana gravou o disco com que não nos atrevíamos sequer a sonhar; tão luminoso e emocionante que alguns temas não se conseguem ouvir sem ficar com pele de galinha. Exagero? Basta ouvir a primeira faixa («Scutam ess morna») para o confirmar. Mesmo reduzida ao essencial, como é aqui o caso, a morna é uma das mais comoventes e insinuantes músicas do mundo. Na verdade, a morna é uma lição de vida, uma ode melancólica à arte de viver. E se a propósito de Tété temos que referir a sua evidente inteligência musical, a propósito de Mário Lúcio temos mesmo de falar de génio. Nas suas mãos, os Simentera - grupo de que é fundador tal como Tété, aliás - a tradição musical de Cabo Verde tem ganho uma complexidade e sofisticação que lhe tem valido elogios no mundo inteiro. Muito bom músico, capaz de tocar vários instrumentos em virtuose, Mário Lúcio é igualmente um excelente compositor e arranjador. No disco em apreço, o seu papel não é o de um simples acompanhante: ele assina quatro das doze composições, tantas como a própria Tété. A cumplicidade entre os dois releva da mais profunda empatia e evoca irresistivelmente a associação Ella Fitzgerald-Joe Pass, que ficou magnificamente eternizada em três ou quatro discos publicados pela PabloVoz é um desses discos-milagre que tem o tempo por aliado, espero que o consiguam encontrar.