quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Elvis Costello



Em Junho de 2005 entrevistei Elvis Costello por telefone, a pretexto de dois concertos que vinha fazer em Lisboa e Porto, para apresentação do álbum The Delivery Man. Como os espectáculos foram anulados à última hora, a entrevista ficou na gaveta. É, pois, um inédito que publico aqui, para que não se perca inteiramente.

Que vai tocar nestes concertos em Portugal?
Os Imposters e eu temos um repertório de mais de cem canções, retiradas de todas as fases da minha carreira. As pessoas poderão ouvir alguns temas do disco The Delivery Man, assim como outras bem conhecidas e até temas que não chegámos a editar mas que ganharam vida ao vivo. De uma noite para a outra é bem possível que mude metade do repertório.

Fale-me dos músicos que o acompanham nesta digressão.
Na minha opinião, não há, hoje em dia, nenhum grupo de palco que me possa dar, enquanto autor de canções, o que estes me dão. Eles conseguem tocar tudo, da mais terna balada à canção rock’n’roll mais explosiva. Steve Nieve está sempre a inventar novos sons e Pete Thomas está a tocar melhor do que nunca. Em Dave Faragher, Pete encontrou o parceiro ideal do ponto de vista rítmico. Davey toca o groove tão bem em temas como «Bedham»... mas também conseguiu apropriar-se de muitas das canções mais antigas.

Não vem nenhuma voz feminina para fazer as partes cantadas por Emmylou Harris e Lucinda Williams no disco?
Em Julho, Emmylou vai aparecer como convidada em alguns concertos que vamos dar nos Estados Unidos. Estou ansioso por voltar a cantar com ela. Lucinda só actuou connosco em duas ocasiões. Ambas estão demasiado ocupadas com as suas próprias digressões neste momento. Por isso, Davey e eu teremos de fazer de «cowgirls» para suprir as suas ausências.

A actual digressão vai levá-lo a vários países europeus e, mais tarde, aos Estados Unidos. Os públicos podem diferir muito de país para país?
Obviamente, a minha relação com a audiência é muito diferente de país para país. Em Inglaterra, essa relação define-se por uma longa lista de singles que atingiram os tops no final dos anos 70. Tudo o que fiz depois disso é considerado inferior pelo grande público e a imprensa não especializada. Nos Estados Unidos, foi em meados dos anos 80 e no início dos anos 90 que os meus discos tiveram sucesso, mesmo se parte do público tomou conhecimento com a minha obra anterior. Os países europeus revelam as maiores diferenças. O single «I want you» alcançou os tops na Holanda, enquanto o meu álbum com mais sucesso em Itália foi Painted From Memory. Só muito recentemente comecei a desenvolver um verdadeiro público na Alemanha, onde o meu álbum North parece ter sido muito apreciado, enquanto em Inglaterra por contraste foi quase desprezado. A minha mais extensa digressão em Espanha foi quando andei com o Brodsky Quartet a promover o álbum The Juliet Letters. Não posso ser popular em toda a parte. Em França estive sete anos sem actuar porque ninguém me convidava para o fazer. Mesmo neste momento não conseguiria encher um chapéu com moedas se actuasse no Metropolitano. Por outro lado, há apenas alguns anos, tive um grande êxito no Japão com uma canção de Charlie Chaplin, «Smile»! O exemplo mais louco é a minha única aparição no Brasil como convidado da Mingus Big Band, cantando letras minhas para algumas das composições de Charles Mingus. A canção «She», que gravei para o filme Notting Hill tornou-se mais tarde um «hit» no Brasil e em muitos países onde sou apenas «O homem que canta ‘She’». Isto inclui a Tailândia e a Coreia.

Quais são os lugares onde prefere ir?
Passo muito tempo a viajar e em digressão, pelo que gosto de regressar a casa de vez em quando. Partilho um apartamento com a minha mulher, Diana, em Nova Iorque, que é a melhor cidade do mundo, sob muitos pontos de vista. Os outros locais de que gosto muito ou que me fascinam incluem Florença, Memphis, Hobart (Austrália), Lalibela (Etiópia) e Liverpool. Gostaria ainda de regressar a Xangai. Também passamos algum do nosso escasso tempo livre perto do mar em Nanaimo, terra natal de Diana, na Columbia Britânica (Canadá). Aí, não é raro vislumbrar, enquanto tomamos o pequeno-almoço, uma águia sentada numa árvore do outro lado da janela.

Está com 50 anos. Tenciona dar concertos para sempre como B.B. King ou os Rolling Stones?
O meu pai tem 78 anos e possui ainda uma grande voz, por isso não tenho que me preocupar. Nunca escrevi canções para adolescentes, pelo que as canções vão envelhecendo comigo... e espero que seja sempre assim. O futuro o dirá.

Para terminar, pode falar-nos dos seus projectos mais imediatos?
Estou sempre a escrever, mas como ando na estrada desde Setembro, é muito cedo para falar num novo disco. No entanto, pode ser que haja alguma surpresa em 2006. Actualmente estou a trabalhar numa obra encomendada pela Royal Danish Opera. Escrevi um «libreto» com 3.500 palavras durante a digressão e estou agora a terminar a parte musical. Não se trata de uma «ópera» no sentido convencional do termo, mas utiliza música e canções para contar uma história inventada por mim que envolve Hans Christian Andersen, o soprano sueco Jenny Lind e P.T. Barnum.