domingo, 8 de março de 2009
Ney Matogrosso
Inclassificáveis
EMI, 2008
Nos seus mais recentes concertos, Ney Matogrosso usa um fato muito justo ao corpo, coberto «por 40 mil micro-lantejoulas» com um elmo, também ele todo coberto por brilhantes, que evoca um adorno ritual inca. A ninguém espantará que, a dado passo, no seu novo espectáculo, ele volte a simular um «stip-tease» tão ou mais ousado e sedutor do que outros a que nos habituou no passado, pois o cantor é um provocador nato. Sempre o foi e não é agora que vai desistir, só porque já está à beira dos 70 anos (fez 67 no dia 1 de Agosto de 2008). Pelo contrário, o seu novo «show» é, segundo o próprio, o mais extravagante de sempre. O primeiro tema do novo CD, assinado por Cazuza, chama-se «O tempo não pára» e o envelhecimento é, como não podia deixar de ser, um dos temas centrais deste disco intenso onde se diz a dado passo: «é preciso estar atento e forte, não temos tempo de temer a morte» («Divino Maravilhoso» da dupla Caetano-Gil). Uma outra canção (esta de Carlos Rennó, escrita a meias com o congolês Lokua Kanza), fala também da velhice dizendo claramente: «Não vou lamentar a mudança que o tempo traz». Inclassificáveis é, pois, o disco de alguém que, apesar de não escrever as suas próprias canções, quer falar do que o preocupa, como o estado actual do Brasil e do mundo por exemplo: «transformaram o país inteiro num puteiro, pois assim se ganha mais dinheiro». E mais adiante, a mesma canção («O Tempo Não Pára») acrescenta: «A tua piscina está cheia de ratos, tuas ideias não correspondem aos factos.» Entre «reprises» de canções mais ou menos conhecidas e temas inéditos, o novo álbum do inclassificável Ney de Souza Pereira, que aqui canta num registo mais grave do que nunca, é um trabalho corajoso e sincero que não hesita em soar rock mesmo quando está a querer ser intimista e confessional.