quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Toumani Diabaté



Toumani Diabaté é um griot. Uma espécie de trovador da África Ocidental a quem cabe transmitir por música e palavras a cultura do seu povo. A condição de griot herda-se de pai para filho e a sua origem perde-se nas noites do tempos. Toumani diz ser o 71º da sua linhagem. Uma doença na juventude deixou-o com uma deficiência numa perna, que não o impede de ser considerado o melhor tocador de kora do mundo.
Gravado em solo absoluto o disco The Mandé Variations (2008), que está na origem desta conversa, é uma obra-prima absoluta, saudada como tal pela crítica especializada do mundo inteiro.

Sendo um griot, quando nasceu já estava decidido que iria tocar kora?
Estou certo de que Deus queria que eu fosse tocador de kora. O meu pai era um grande tocador de kora, tal como o seu pai. Eu represento a 71ª geração de tocador de kora da minha família. O meu filho já está pronto para seguir as minhas pisadas. Tenho muito orgulho nele. Somos guardiães da nossa cultura e a nossa obrigação é dar a conhecê-la no mundo inteiro.

No entanto, tanto quanto sei, não foi o seu pai quem lhe ensinou.
Pois não. Ele viajava muito, mas quando podia ouvia-me para ver os meus progressos. Pela expressão do seu rosto, via quando ficava contente ou não.

Quando era muito novo não se tornava penoso ter que trabalhar o instrumento em vez de ir brincar com os outros miúdos?
Nunca senti isso que era penoso. É verdade que aprender a tocar seja que instrumento for é algo muito exigente, e passei muito tempo a tocar kora enquanto os outros brincavam à minha porta.

Num tempo em que fazer música é tão fácil graças às novas tecnologias e à Internet, ainda faz sentido ser griot?
Mesmo com as novas tecnologias, não é fácil fazer música e transmitir a história de um povo, não perder a memória e continuar a criar. Mesmo no século XXI os griots são os nossos lçivros de história e a sociedade continua a precisar de griots.

Uma vez afirmou que tinha sido inspirado por Jimi Hendrix e Otis Redding. Que outros músicos o marcaram?
Muitos… os Beatles, os Scorpions, a música cubana, Fela Kuti…

Já tocou com os Ketama, Taj Mahal, Bjork. Este tipo de experiências enriquece a sua visão musical?
Sempre que toco com bons músicos isso torna-se numa experiência inesquecível. Temos sempre coisas a aprender uns com os outros. Em Bamako toco com todo o tipo de pessoas. Com Tiken Jaha Fakoli, por exemplo. Estou sempre disposto a todo o tipo de colaborações, mas ao mesmo tempo muito concentrado na minha própria música.

Porque citou Ennio Morricone no princípio de um dos temas?
Foi uma maneira de chamar a atenção do público e criar uma cumplicidade.

Alguns músicos mais tradicionais não o acusam de trair a música mandingue ao modernizá-la?
Pelo contrário. Têm muito orgulho em mim, pelo que eu tenho feito pela kora.
Você toca vários tipos de kora. Pode falar-me dos diversos instrumentos que usa?
Para mim, a kora é uma só. Toco diferentes tipos de kora por razões técnicas, mas a kora de que mais gosto é a tradicional.

Que procurou fazer com «The Mandé Variations»?
Só tinha gravado um disco de kora a solo há 20 anos. Foi o primeiro disco desse tipo no mundo. A minha editora propôs-me gravar novamente a solo e fiquei muito contente. É a minha especialidade. Cada tema do disco representa um momento da minha vida, ou alguém que foi muitoi importante para mim.

Foi a editora que escolheu o título do disco?
Sim, mas entusiasmou-me logo.

Uma boa parte do disco é totalmente improvisada…
A improvisação tem um papel fundamental na minha música. A kora permite-me tocar o solo, o baixo e ainda improvisar ao mesmo tempo. É a capacidade de improvisar que diferencia os músicos entre si. A técnica é algo que se pode aprender, a capacidade de improvisar não.

É inevitável que lhe fale de Ali Farka Touré. Sente-se seu herdeiro?
Estive com ele até ao último momento. Ele pediu-me para continuar o seu trabalho: dar a conhecer a cultura do Mali no mundo inteiro. Nunca o esquecerei e penso nele antes e depois de cada concerto.